31 de maio de 2011

Rubrica "Os melhores álbuns de sempre": XUTOS & PONTAPÉS - "1º DE AGOSTO NO RRV (1986) / "CIRCO DE FERAS" (1987)


No Portugal de meados da década de 80, os primeiros adolescentes da democracia começavam a assimilar a cultura e as modas  "lá de fora". Surge uma leva de bandas que, sendo mais obscuras que aquelas do boom do rock anos antes, tinham uma maior profundidade lírica e musical e, sobretudo, uma atitude e um estilo ligados directamente aos movimentos da música pop-rock mundial. Nesse capítulo, o Rock Rendez- Vous (RRV), em Lisboa, assumia-se como a catedral das novas tendências da música.
Associados a esse local e a essas novas correntes, os Xutos e Pontapés surgem como a mais destacada dessas bandas. Com a entrada de um novo guitarrista  - o virtuoso João Cabeleira - a banda começa a aprofundar as características únicas do o seu som, ao mesmo tempo que vão cimentando um estatuto com sucessivos concertos.
A pedrada no charco foi o álbum "Cerco" (de 1985) e as diversas canções editadas em singles e colectâneas na altura. Foi precisamente na tourneé de apoio a esse álbum que os Xutos gravam  "1º de Agosto no RRV". Gravado ao vivo naquela sala, o concerto passa pelos melhores temas do disco que  promovia, como o eterno "Homem do Leme", o hit da altura, "Barcos Gregos", e a pérola que é "Conta-me Histórias". Constam também outras canções contemporâneas a esse trabalho, e que nele poderiam estar, como: "Esquadrão da Morte", "Remar Remar" e "1º de Agosto". A isto somam-se os primeiros sucessos do grupo como "Sémen", "Avé Maria", "Morte Lenta"... e até a versão da "Minha Casinha", que já era interpretada em concerto. O álbum - editado oficialmente em 2000 - é um autêntico manual do "som à Xutos", com toda energia e personalidade que se tornariam a sua imagem de marca.  
Um ano depois daquele concerto, o grupo edita o álbum "Circo de Feras", ainda sob o tom de revolta, de rebeldia e de não alinhamento que caracterizava as suas canções prévias. O talento para a composição assim como os traços mais característicos do grupo, como a voz de Tim, os riffs de Cabeleira, e a pujança de Zé Pedro e Kalú, estão lá todos. Sem esquecer o sax de Gui. "Não Sou o Único", "Contentores", "Circos de Feras" e "Vida Malvada" são temas que ficaram para a história dos Xutos, para além de outros como "N'América", "Esta Cidade" etc.
Depois desta fase, o grupo cimentou a carreira que todos conhecem, com clássicos como "88" ou "Dizer Não de Vez", até alcançar o estatuto da melhor banda portuguesa de todos os tempos. Mas a essência da sua música nasceu aqui.



15 de maio de 2011

Os melhores álbuns de sempre: PARADISE LOST - «ONE SECOND» (1997)


Os Paradise Lost são considerados das bandas, se não "a" banda, que institui o que se chama o gothic metal e que produziu vários álbuns marcantes dos quais se destaca o mítico "Icon" (de 1993) - que poderia estar nesta rubrica - e que os levou a serem considerados das melhores bandas de metal britânicas de sempre. Por tudo isso, o grupo é idolatrado ainda hoje por muitos fãs do género, apesar de entretanto terem editado vários álbuns menores, uns por caírem num comercialismo descabido outros por revelarem alguma falta de frescura.
Sensivelmente a meio deste processo quando a sua carreira respirava um sucesso razoavelmente massivo, o grupo edita aquele que é um dos álbuns que melhor mistura o rock com a electrónica. Estávamos no apogeu da música electrónica que dominou o final dos anos 90 e os Paradise Lost arriscam pintalgar os seu gothic-metal com os sons mais inovadores que se ouviam na altura, ao mesmo tempo que investem num formato de canção baseado naquele estilo de pop melancólica tão celebrizada por bandas como os Depeche Mode.
O resultado é deslumbrante mas não seria o mesmo se essa mudança fosse artificial, como nos álbuns sequentes se veio a verificar. Pelo contrário, neste disco respira-se inspiração, anseio por arriscar mas ditado pelo coração, com muita naturalidade.
Sinteticamente, este álbum está dividido em dois: por um lado os temas mais rock, na linha das canções mais acessíveis da primeira fase da carreira do grupo, decorados com uma produção mais moderna que adiciona leves sons electrónicos ou uma linha marcante de piano (algo que passou a ser muito popular mais tarde noutros grupos). Por outro lado, são aqui introduzidos um estilo de canções que os Paradise Lost nunca tinham feito: mais calmas, introspectivas, com muito mais elementos tecnológicos e que apostam em larga medida na conjugação entre silêncios e intensidade sonora; e é esta a chave da genialidade deste disco.
Para além de sucessos instantâneos como o tema título ou "Say Just Words", o grande valor deste álbum está nos temas negros e épicos, com uma sensibilidade melódica muito pop é certo, mas que alcançam o estatuto de grande canção para qualquer ouvido independentemente de um dado gosto musical específico. "Mercy" é um grande tema intemporal em que os sintetizadores tem uma importância fundamental não deixando de ser uma antítese do que é comercialismo; "The Sufferer" é uma canção com grande impacto ao vivo e aquela em que está mais explícita a dicotomia calma/intensidade; a melodia de "This Cold Life" arrepia até o mais insensível enquanto que "Sane" é impecavelmente bem produzida. Por fim temos "Disappear", um auntêntico hino, profundo e grandioso.
Por uma razão ou por outra, e por muito preconceito, este álbum passou ao lado de muito boa gente. Pode ser que cada um, ouvindo-o do princípio ao fim, se aperceba do que tem em mãos.